O blogue Media Shift da PBS tem uma boa história sobre o estado actual do Second Life, especialmente no que toca à forma como é visto pelos media. Muito do enfoque é posto no encerramento do serviço Reuters SL [a extensão no metaverso desta agência noticiosa britânica] no final do ano passado.
"Estávamos principalmente interessados no Second Life como fenómeno de negócio/comércio/economia", explica o jornalista da Reuters Adam Pasick ao Mark Glaser do Media Shift. "[Mas] no fundo a história que estávamos ali para seguir tinha mudado".
Especialmente vinda de um jornalista que deixou passar ao lado tantas notícias de negócios quando o Second Life era o seu principal foco de atenção...
Conforme eu disse a Glaser, tanto o Pasick com o assistente dele, Eric Krangel, são bons jornalistas que contaram muito boas histórias sobre o SL, mas "não creio que alguma vez estivessem apaixonadamente envolvidos com este meio nem com a comunidade do Second Life a um nível experiencial... [o que, consequentemente] levou a que ambos não conseguissem amiúde apreender a visão global".
E quão regularmente isso aconteceu? Bom, considerem todas as histórias relevantes de negócios/comércio/economia que a Reuters não deu em primeira-mão, quando a agência estava a trabalhar no SL:
- A Reuters não foi a primeira a contar que os receios causados pela ferramenta CopyBot estavam a pôr em risco toda a economia do SL. Foi The Second Life Herald que o fez.
- A Reuters não foi a primeira a contar que as taxas de retenção do SL eram muito menores do que aquilo que largamente se pensava. Foi Tateru Nino quem o fez, a escrever para este blogue.
- A Reuters não foi a primeira a contar que um realizador de cinema tinha vendido os direitos da sua machinima do SL à HBO. Foi este blogue que o fez.
- A Reuters não relatou extensivamente sobre o valor relativo dos objectos virtuais na economia do SL. Foi The New York Times que o fez.
- A Reuters não deu a notícia de que o campus empresarial da IBM no SL foi palco de uma enorme manifestação internacional de trabalhadores. Foi este blogue que o fez.
- A Reuters não foi a primeira a contar que o director executivo de tecnologia (CTO) Cory Ondrejka ia ser despedido da Linden Lab. Foi Moo Money quem o fez, no Massively.
- A Reuters não deu a notícia de que um coleccionador de arte tinha comprado um trabalho experimental feito no Second Life por um valor de seis dígitos. Foi The New York Times que o fez.
- A Reuters não deu a notícia de que a Playboy Corporation estava a investigar possíveis casos de violação de direitos de autor e imagem de marca no SL. Foi o iReports da CNN que o fez.
- A Reuters não calculou o valor das receitas que a Linden Lab estava a registar com o SL. Foi este blogue que o fez.
- A Reuters não deu a notícia de que numerosos empresários e criadores do mundo real estavam a usar o SL para trabalharem em protótipos de conteúdos reais. Foi a BusinessWeek que o fez.
Chamar a atenção para isto não tem a intenção de um ataque a Eric ou Adam, os quais, como disse antes, fizeram algum bom trabalho jornalístico sobre o SL. (A percepção que tenho, talvez errada, é de que o trabalho que faziam no SL era uma responsabilidade a tempo parcial.). Porém, a partida da Reuters tem frequentemente sido mal interpretada como um sinal de que o noticiário sobre negócios no SL secou, por isso creio que é necessário fazer uma clarificação. O facto é que existem notícias, antes como agora, só que é preciso mais do proverbial uso dos sapatos para as encontrar, é precisa muita socialização, conversação desenvolta e exploração ao acaso.
Então por que razão a Reuters deixou passar tanta coisa?
Na minha opinião, isso deveu-se provavelmente a uma falta de interesse pessoal na experiência no metaverso. Eric reconheceu-o quando, de seguida, descreveu o tempo passado como jornalista in-world como uma actividade "desagradável" ou "aborrecida" e que só a via como um trabalho. Para mim isto soa a algo parecido a contratar um tipo que odeia ver filmes de Hollywood para cobrir a indústria do cinema. Podem constatá-lo na descrição que Eric faz da experiência de estar numa discoteca do SL: "Eu clicava no piso de dança para pôr o meu avatar a girar enquanto estava sentado em casa em frente ao computador. Era tão divertido como ficar a ver tinta a secar."
Julgo que esta descrição falha profundamente na compreensão da experiência, e explica em enorme parte o falhanço da Reuters. O objectivo de dançar no Second Life não é a dança per se, mas sim o de partilhar um contraponto visual e uma âncora de referência com as conversações em grupo e os IM que se desenrolam em volta. Ou, pondo-o de uma outra forma: conduzi algumas das minhas entrevistas favoritas em Instant Message enquanto o meu avatar estava às voltas como um idiota. (Sim, até no caso de histórias de negócios.) E quando outras pessoas que escrevem sobre o metaverso perceberem que têm de dar esse salto de imersão sensorial, então encontrarão também um mundo abundante de histórias para eles próprios descobrirem e contarem.
Crédito da imagem: secondlife.reuters.com
Sobre a tradutora Tonjampae Amat: "Lisboa é a minha cidade, de entre algumas outras que ouso chamar minhas. Adoro a sua luz, a heterogeneidade do seu povo - e agora já estou a falar do meu país - e a riqueza da sua língua. Sou jornalista e escrevo sobre política internacional. (Aprendi as primeiras coisas que sei sobre política em livros de ficção científica, uns livros pequeninos, de capa azul, que povoaram as tardes da minha infância e adolescência). "Descobri o Second Life através de amigos, que mo apresentaram como um espaço de comunicação global e um universo de criatividade em contínua expansão. Fez-me recordar os meus sonhos de Argonauta. Já lhe vou dominando a linguagem nas palavras e, mesmo não tendo ainda sido capaz de desenhar sequer uma linha recta, sei que um dia conseguirei construir um barco."
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