A comunidade do Second Life regozija-se com os numerosos grupos de roleplay que possui baseados em propriedades intelectuais bem conhecidas. Uma enorme multiplicidade deles derivam das narrativas de Star Wars, como aqui, e de Star Trek, como aqui. Muitos são extremamente grandes; o número de Residentes que jogam em cenários inspirados dos romances Gor de John Norman, por exemplo, está estimado em quase 50 mil.
Entre os mais pequenos destes grupos há um dedicado a Dune, a franchise clássica de ficção científica de Frank Herbert que engloba livros, filmes e outras criações com direitos de propriedade intelectual. O líder do grupo, Vooper Werribee, conta 130 membros que gostam de jogar nas areias de um Arrakis construído no Second Life, assumindo personagens do povo Fremen, os cavaleiros de vermes da areia, ou da Casa Harkonnen, rivais dos Atreides, e outros mais. (Ele crê que uns 20 por cento dos membros estão actualmente activos.)
Apesar os números escassos, no passado fim-de-semana [4 e 5 de Abril] Werribee e outros membros do grupo receberam notificações legais da Linden Lab, em nome da Trident Media Group, a agência literária nova-iorquina que administra o património de Herbert. "A Trident Media Group reclamou, em particular, do uso que estão a fazer no ambiente do Second Life de personagens, conceitos e outro material intelectual associado com o 'Dune'". Isto inclui cenários de roleplay chamados "Sardaukar Mask", "Fremen Domain" e "Bene Gesserit Retreat". A notificação dos Lindens exigia que Werribee e o seu grupo retirassem tais títulos e objectos do Second Life no prazo de dois dias, sob pena de a empresa o fazer ela própria.
Tentei por duas vezes, em tantos outros dias, confirmar esta notificação com o agente da Trident identificado na mesma, mas não recebi qualquer resposta. Recebi, porém, uma confirmação dos Lindens (a declaração na íntegra está mais abaixo).
Assim, este é talvez o primeiro caso publicamente confirmado de um grupo de roleplay do SL a ver-se em apuros por alegadas violações de direitos de autor. Vooper Werribee não contesta o direito da Trident de emitir aquela notificação, apesar de achar "muito curioso como isto se manifestou em relação a um cenário algo obscuro quando os sims de roleplay baseados no Star Wars e no Star Trek não sofreram a mesma imposição de respeito pelos direitos de propriedade intelectual". Mas, por outro lado, ambas aquelas franchises têm um longo historial de permitir aos seus fãs criar trabalhos derivados, desde que não sejam caluniosos e não sejam obtidos lucros. (Werribee diz-me que nunca fez qualquer lucro com o seu sim desértico, cobrando apenas fees de aluguer para ajudar a minimizar os custos da terra, e que, pelo contrário, perdeu vários milhares de dólares para manter a propriedade.)
E qual é a posição dos Lindens no que respeita ao roleplay no Second Life baseado em criações cujos direitos intelectuais não foram autorizados? A Linden Lab enviou-me esta declaração, emitida pela equipa jurídica da empresa:
"Estamos impressionados com a criatividade dos jogos de role-playing no Second Life e acreditamos que constituem uma parte importante da experiência social in-world. Quando os proprietários de direitos de autor nos notificam sobre as suas preocupações em relação ao uso que fãs estão a fazer das suas propriedades intelectuais, nós transmitimo-las. Temos a expectativa que as partes comuniquem directamente para resolverem o diferendo de uma forma que assegure o respeito pela propriedade intelectual sem deixar de oferecer óptimas experiências aos fãs e jogadores no Second Life."
Pela altura em que visitei o Arrakis de Vooper Werribee, já a versão de Dune dele fora devidamente rebaptizada. Ele manteve, porém, o uniforme de um membro da Casa Atreides. Perguntei-lhe se estava a planear retirar do Second Life os restantes objectos que possui inspirados no Dune.
"Não", respondeu. "Fizemos todas as mudanças conforme à notificação que pretendemos fazer agora. Basicamente, tirámos as palavras 'Dune', Bene Gesserit, Atreides, etc. de todos os nomes de objectos e descrições que encontrámos. Mas estamos determinados em manter o espaço como um planeta deserto 'genérico' de ficção científica onde é feita a mineração de especiaria [alusão à especiaria Melange, a substância aditiva presente em Dune]. E pretendo continuar a jogar lá".
Ironicamente, conta-me Werribee que roleplayers de Star Trek lhe expressaram interesse em usar o sim para cenários de "primeiro contacto" [em referência ao oitavo filme da franchise, Star Trek: O Primeiro Contacto, de 1996]. "E alguns jogadores de Star Wars querem usá-lo como uma base de 'mineração de especiaria'", junta ele. "Uma vez que o Star Wars tem 'especiaria'".
"A especiaria tem que fluir?", sugiro-lhe.
Vooper Werribee ri-se. "Seguramente que tem!"
(Caption:) Vooper Werribee no topo de um disputado verme da areia
Sobre a tradutora Tonjampae Amat:
"Lisboa é a minha cidade, de entre algumas outras que ouso chamar minhas. Adoro a sua luz, a heterogeneidade do seu povo - e agora já estou a falar do meu país - e a riqueza da sua língua. Sou jornalista e escrevo sobre política internacional. (Aprendi as primeiras coisas que sei sobre política em livros de ficção científica, uns livros pequeninos, de capa azul, que povoaram as tardes da minha infância e adolescência).
"Descobri o Second Life através de amigos, que mo apresentaram como um espaço de comunicação global e um universo de criatividade em contínua expansão. Fez-me recordar os meus sonhos de Argonauta. Já lhe vou dominando a linguagem nas palavras e, mesmo não tendo ainda sido capaz de desenhar sequer uma linha recta, sei que um dia conseguirei construir um barco."
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